Ciclo de Debates Direito e Política resgata memória do período da ditadura civil militar no Brasil
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As letras de músicas compostas durante o período da ditadura civil militar no Brasil marcaram a abertura do Ciclo de Debates Direito e Política com o painel Memória, Verdade e Justiça, na terça-feira (12), no auditório do Centro Administrativo Fernando Ferrari, promovido pela PGE e Escola Superior da Advocacia Pública da Apergs.
O Procurador-Geral do Estado, Carlos Henrique Kaipper, apresentou na abertura do Ciclo para o público presente, fotos tiradas durante as manifestações de rua nos meses de junho e julho de 2013 com jovens portando faixas em defesa da ditadura militar.
"Essa provocação demonstra a importância deste debate para que a ditadura civil militar, com todas as suas nefastas consequências, jamais se repita. A responsabilidade do resgate da memória, da verdade e da justiça é de todos nós, governos e sociedade civil", enfatizou Dr. Kaipper.
Abrindo a participação dos convidados, o compositor, ativista de Direitos Humanos do Comitê Carlos de Ré e condenado/exilado político Raul Ellwanger concedeu um depoimento musical, no qual intercalava sua história de vida e do país com músicas como "O gaúcho" e "Pialo de Sangue", de sua autoria, e composições de Geraldo Vandré, Mercedes Sosa e Chico Buarque.
Raul relembrou diversos fatos ocorridos envolvendo a mídia e a ditadura. "A mídia não contava o que acontecia, como os sequestros dos militantes e os atos de tortura. Enquanto estes atos aconteciam, o chefe de polícia oferecia coquetel para a imprensa. Donos de jornais deram golpe, praticaram crimes contra a humanidade e hoje continuam aí", denunciou Raul.
Fatos como a Operação Sossego, em que 500 pessoas foram presas em Porto Alegre numa ação policial travestida do significado de garantir segurança para a população, o assassinato de 119 chilenos, tratado por jornal do Chile como um acerto de contas entre os próprios assassinados, a censura de músicas e shows foram trazidos pelo compositor como marcantes no período em que se lutava pela democracia.
Raul viveu como exilado no Chile e na Argentina. "No exílio, uma forma de censura espantosa, a pessoa deixa de existir em seu país. Eu comparo com a clandestinidade, uma forma de subvida. Milhares de brasileiros viveram na clandestinidade e alguns não voltaram", analisou Raul.
Comissão Estadual da Verdade/RS
Guazzelli, ao fazer referência à provocação do Procurador-Geral do Estado na abertura do Ciclo, avaliou que atrás da rejeição de políticos vem a rejeição à política, e a rejeição da política é a rejeição da própria democracia, "por isso, a importância do processo de memória e verdade instalado no Brasil, mesmo que tardiamente".
Segundo dados da Comissão de Anistia, mais de 60 mil pessoas foram torturadas no Brasil nos 21 anos de ditadura militar. Estudo comparado das ditaduras no Cone Sul demonstra que no Chile, para cada dois mortos um era preso; na Argentina, para cada 71 mortos há um preso que cumpre pena; e no Brasil, para cada um morto, 23 presos. "Esses dados explicam porque existem mais relatos de tortura no Brasil do que nos outros países", avaliou Guazzelli.
A CEV/RS conseguiu, com o apoio de movimentos sociais e do Comitê Carlos de Ré, vários relatos de como eram feitas as torturas no período de repressão militar, e de várias outras violações dos Direitos Humanos. Citou o "Caso das mãos amarradas", em que foram cinco meses de tortura seguida da morte, sendo que o cadáver foi encontrado no Guaíba com as mãos amarradas para trás.
De acordo com Guazzelli, a Comissão Estadual, neste um ano de trabalho, 50 pessoas foram ouvidas e cinco audiências públicas já foram realizadas.
Questão de gênero
A debatedora do evento, Secretária de Políticas para as Mulheres, Ariane Leitão, fez um apanhado do recorte de gênero no período da ditadura civil militar. "A participação das mulheres na luta pela democracia possui dados imprecisos. Acredita-se que em torno de 11% dos mortos e desaparecidos eram mulheres", expôs a Secretária.
"O sofrimento das mulheres foi diferenciado porque praticamente todas foram vítimas de violência sexual. É a maneira mais ultrajante de tortura por atingir o ápice de sua intimidade", afirmou Ariane.
A Secretária também frisou que a causa de gênero é pouco discutida e aprofundada neste período de graves violações aos Direitos Humanos. "Devemos publicizar as ações e atuações dessas mulheres anônimas, que sofreram e lutaram pela democracia".
Dezenas de manifestações do público exploraram a importância do evento promovido pela PGE e pela Esapergs e de outras atividades futuras que preservem a memória e a verdade dos fatos ocorridos na ditadura militar, que consigam promover a justiça e punir os torturadores. Também foi feita referência ao trabalho desenvolvido pela Associação Psicanalítica Sigmund Freud, com a Clínica do Testemunho, onde é dado apoio psicológico àqueles que desejam prestar seus testemunhos de fatos ocorridos na época da depressão.
Assim como a questão da desmilitarização das polícias, a implantação da cultura de Direitos Humanos na grade curricular do curso de formação das Academias Militares também foi defendida pelo público presente.
Em uma das intervenções do público, foi relatado que, para constranger os presos políticos, os depoimentos eram tomados com eles nus e assim eram tiradas fotos fotos de frente, de lado e de costas.
Ainda foram prestados relatos de demissões injustificadas, pessoas sendo chutadas no chão, choques elétricos, pau-de-arara e também várias formas de tortura psicológicas.
Entre os presentes no Ciclo de Debates o Diretor-Presidente da Esapergs, Procurador do Estado Eduardo Cunha da Costa, o Presidente da Apergs, Telmo Lemos Filho, a Secretaria Adjunta da Secretaria de Políticas para as Mulheres, Ana Félix, o Juiz de Direito Mauro Borba representando a Ajuris, o Delegado de Polícia Vinícius Puricelli Faccini, representando o Chefe de Polícia Delegado Ranolfo Vieira Júnior, o vereador Pedro Ruas, ex-presos políticas, representantes de movimentos de Direitos Humanos, Procuradores do Estado, Servidores da PGE e público externo.
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